Realçar o diálogo com a sociedade para garantir que as portas estejam sempre abertas. Essa foi a marca da gestão atual aos olhos do presidente do Tribunal Superior do Trabalho, ministro Carlos Alberto Reis de Paula, que deixa o TST em razão de sua aposentadoria após dezesseis anos de atuação. O ministro destacou a importância da Justiça do Trabalho para a busca das convergências entre aqueles que representam a economia e o capital e os que respondem pelo trabalho e profissões.
Após onze meses na Presidência do TST, o ministro foi enfático ao afirmar que, se não houvesse a Justiça do Trabalho, não haveria segurança nas relações trabalhistas, sendo este ramo da Justiça fundamental para o desenvolvimento do tecido social hoje existente no país. "O Brasil não estaria na posição em que está, pois a Justiça do Trabalho ordena, pacifica e ajuda tanto o capital quanto o trabalho a caminhar".
Ao destacar os principais avanços registrados durante sua administração, Carlos Alberto Reis de Paula citou a conversão de várias iniciativas em um programa amplo de combate ao trabalho infantil e a continuidade das ações de gestões anteriores com relação ao programa Trabalho Seguro, com o envolvimento dos 24 Tribunais Regionais do Trabalho.
Outro ponto destacado pelo presidente do TST foram os avanços com relação ao Processo Judicial Eletrônico (PJe), para o qual se gerou mais segurança e estabilidade. Na avaliação do ministro, o PJe é um instrumento em evolução, cuja implantação, para ter êxito, passa pelos seguintes requisitos: gerar confiança e ser um instrumento seguro e estável.
"No final do ano, lançamos um novo sistema que está sendo acolhido por todos os tribunais regionais porque incorporamos várias reivindicações com relação à distribuição, presença de revisor e acesso dos juízes a dados sobre penhora e execução. Evoluímos muito. O PJe está no caminho certo", analisou o ministro, que enxerga o PJe como "elemento de libertação" para facilitar o acesso das partes envolvidas nos processos e a atuação de servidores, advogados e magistrados.
Ao lembrar que o TST, no último ano, julgou 24% mais processos que no ano anterior, o presidente do Tribunal afirmou que a estatística leva a duas conclusões: o crescimento extraordinário do número de recursos que chegam ao TST e a dedicação dos ministros, que conseguem se superar e julgar mais processos a cada ano.
Ao destacar o empenho dos julgadores, o ministro afirmou que o que mais sentirá falta ao deixar a Presidência do TST será o convívio com servidores e colegas. "A magistratura é um grande desafio e motivo de inquietude porque as necessidades são muitas e nós temos o desafio de nos adequar a essas necessidades e ao que a sociedade mais necessita: prestação jurisdicional célere e o restabelecimento da harmonia".
Veja a íntegra da entrevista concedida pelo ministro Carlos Alberto Reis de Paula:
P – Qual legado o senhor considera que está deixando após seu mandato?
R – É interessante realçar o diálogo que estabelecemos com a sociedade para que nossas portas estivessem sempre abertas. No mundo do trabalho, temos, de um lado, aqueles que representam a economia e o capital e, de outro, os que respondem pelo trabalho e as profissões. O objetivo da Justiça é buscar as convergências, os pontos em comum entre esses dois grandes grupos e isso temos atingido. Nos aproximamos também do Poder Legislativo quando buscamos a aprovação de projetos de lei de nossa iniciativa que tratam do sistema recursal trabalhista e da execução trabalhista. A partir desse contato maior com os parlamentares, conseguimos fazer com que essas matérias tivessem um andamento mais célere no Congresso Nacional. Buscamos, pois, um maior diálogo com a sociedade e com os demais Poderes da República. Esta foi, acredito, a grande marca dessa administração.
P – Em quais pontos o senhor destaca que houve avanços para a Justiça do Trabalho e em quais acredita que ainda seja possível avançar?
R – Além do avanço nesse diálogo estabelecido com a sociedade, tivemos que olhar para nós mesmos, para a necessidade de nos qualificarmos cada vez mais, buscar o aperfeiçoamento técnico e melhores instrumentos para darmos uma prestação jurisdicional mais adequada. Nessa linha, destaco o grande avanço que tivemos com o Processo Judicial Eletrônico (PJe), para o qual buscamos dar mais segurança e estabilidade nesta gestão. Destaco, ainda, a continuidade que demos às ações de gestões anteriores com relação ao programa Trabalho Seguro, com o envolvimento dos 24 Tribunais Regionais do Trabalho, e a conversão das iniciativas voltadas para combate ao trabalho infantil em um amplo programa que deve se tornar uma bandeira de toda a sociedade.
P – Com relação ao Processo Judicial Eletrônico (PJe), quais foram os principais avanços para a celeridade dos julgamentos e para a Justiça?
R – O PJe é um instrumento em evolução, cuja implantação, para ter êxito, passa obrigatoriamente pelos seguintes requisitos: tem que gerar confiança e ser um instrumento seguro e estável. Entre os avanços que posso citar está principalmente o fato de termos gerado essa confiança esperada com relação ao PJe. Desde novembro, não temos grandes incidentes nos Tribunais onde está implantado. No final do ano, lançamos um novo sistema que está sendo acolhido por todos os tribunais regionais porque incorporamos várias reivindicações com relação à distribuição, presença de revisor, acesso de juízes a dados sobre penhora e execução. Evoluímos muito. O PJe está no caminho certo. É um programa que sempre estará em desenvolvimento, mas é indispensável que, junto aos nossos comitês gestores, haja um diálogo permanente em prol de um contínuo aperfeiçoamento. Eu acredito no êxito de sua implantação, sendo este um elemento de libertação para facilitar o acesso das partes envolvidas nos processos e a atuação de servidores, advogados e magistrados.
P – Que balanço o senhor faz dessa gestão?
R – Eu diria que foi positivo porque as metas que estabelecemos nesse curso espaço em que exerci a Presidência, pouco mais de onze meses, foram alcançadas. Nos aproximamos dos Tribunais Regionais, cuidamos dos interesses dos magistrados e servidores e buscamos ouvir e estar próximos da sociedade, além de trazer as reivindicações das camadas sociais para dentro da Justiça do Trabalho. O aprendizado também foi grande. A magistratura é um grande desafio e motivo de inquietude porque as necessidades são muitas e nós temos o desafio de nos adequar a essas necessidades e ao que a sociedade mais necessita: prestação jurisdicional célere e o restabelecimento da harmonia. Sempre digo que a finalidade do Direito é instaurar a paz. A justiça visa a paz e viabilizar a composição diante do conflito.
P – O senhor está no TST desde 1998. Nesses dezesseis anos, o que viu de mudança na estrutura e funcionamento do Tribunal?
R – É um desafio diário. Entrei no TST em fevereiro de 1998 como juiz convocado e, hoje, já são 16 anos como ministro. Aprendi muito com o convívio com os demais ministros e os desafios foram imensos, especialmente quando constatamos o volume gigantesco de processos para julgamento. Com o passar do tempo fomos mudando a forma de trabalhar. Hoje, em decorrência desse desafio, trabalhamos com um sistema bem diferente daquele de quando entrei, não só com relação à organização dos gabinetes, mas principalmente quanto aos recursos tecnológicos de que dispomos para as sessões de julgamento. E temos que continuar na busca de novas soluções porque, se não houver uma mudança no sistema recursal trabalhista, especialmente quanto ao recurso de revista, seremos engolidos pelo enorme volume de processos. Hoje, cada ministro do TST recebe de 1.100 a 1.200 processos por mês, o que é muito excessivo. Não é possível se buscar qualidade na prestação jurisdicional com essa quantidade de processos em cada gabinete.
P – Com relação à quantidade de processos, o senhor acredita que se houvesse mais observância às Orientações Jurisprudenciais e súmulas nos TRTs o número de recursos seria menor?
R - Ninguém está vinculado às nossas súmulas e Orientações Jurisprudenciais, mas, obviamente, elas significam uma consolidação da jurisprudência. Eu não diria que a sua observância é uma questão de disciplina judiciária, mas é preciso pensar na responsabilidade institucional, pois a reiterada conduta de afastamento das súmulas e OJs faz com que se multipliquem os recursos. É claro que as súmulas e Orientações Jurisprudenciais não podem ser fossilizadas, podem, sim, ser objeto de revisão. No entanto, para que sejam repensadas, é fundamental que, quando houver discordância por parte do magistrado, ele fundamente porque julgou em confronto com a jurisprudência.
P – O TST recebeu 290 mil processos no ano passado. Desses, 68% foram julgados, o que equivale a 24% a mais do que no ano anterior. Como o senhor analisa esses números?
R – Essa estatística indica o crescimento extraordinário do número de recursos que chegam ao TST. De outra sorte, revela o empenho e dedicação dos ministros que, cada vez mais, conseguem se superar e julgar mais processos que no ano anterior. Mas há um limite e este não se refere somente à busca por condições mais dignas de trabalho para ministros e servidores. O limite também é o de buscar a qualidade nos nossos julgamentos. Não podemos ser atropelados pela imposição de velocidade nos julgamentos. Quando começarmos a julgar um número cada vez maior de processos para respondermos a uma necessidade maior, correremos o risco de perder a qualidade. O meio termo entre qualidade e quantidade é o que precisamos buscar.
P – O senhor hoje, com o olhar de quem presidiu o Tribunal, acredita que a Justiça do Trabalho tem atuado para que o direito seja cada vez mais garantido?
R – O Direito do Trabalho surgiu exatamente para proteger o trabalho. Nesse convívio entre o trabalho e a livre iniciativa, entendo que a Justiça do Trabalho se reafirma cada vez mais como indispensável à sociedade. Ela é indiscutível, na minha opinião. Se não houvesse a Justiça do Trabalho não haveria segurança nas relações trabalhistas. Digo mais: não haveria crescimento. O Brasil não estaria na posição em que está, pois a Justiça do Trabalho ordena, pacifica e ajuda tanto o capital quanto o trabalho a caminhar. A Justiça do Trabalho é fundamental para o desenvolvimento desse tecido social indispensável ao Brasil de hoje.
P – Do que o senhor mais sentirá falta ao deixar o TST?
R – Sentirei muita falta das pessoas com quem convivi nesses 16 anos de TST, dos colegas ministros e servidores que trabalharam comigo no meu gabinete quando desempenhei as funções de corregedor, posteriormente como integrante do Conselho Nacional de Justiça e, agora aqui, no exercício da Presidência. É uma travessia. Estamos sempre caminhando, aprendendo e construindo, mas o mais importante é carregar as lições. O convívio fará falta, mas a saudade e as lembranças serão fator determinante para que eu possa dar continuidade à minha travessia.