TRT-SC participa da primeira audiência pública no Estado sobre uso do amianto na cadeia produtiva

Evento foi promovido pelo MPF e MPT, que pretende intensificar fiscalização junto aos distribuidores de telhas em SC

01/04/2014 11h50
Mmagistrados na ALESC
Audiência pública foi realizada no auditório principal da Assembleia Legislativa


O Ministério Público do Trabalho (MPT) e o Ministério Público Federal (MPF) realizaram, nesta segunda-feira (31), a primeira audiência pública no Estado para discutir os danos causados à saúde pelo amianto, substância utilizada principalmente em telhas e pastilhas e lonas para freios. O evento aconteceu na Assembleia Legislativa de Santa Catarina e, além de dois especialistas, foram convidados para participar o gestor regional do Programa Trabalho Seguro, desembargador do TRT-SC Amarildo Carlos de Lima, representantes da Secretaria de Estado da Saúde, do Ministério do Trabalho e Emprego e das empresas que vendem o produto no varejo. Os sindicatos que representam a categoria profissional também foram convidados, mas não enviaram representantes.

O objetivo foi conscientizar os lojistas sobre as obrigações impostas pela Lei 9055/95, que regulamenta o uso do amianto (também conhecido como crisotila) na cadeia produtiva. De acordo com a procuradora do trabalho Márcia Kamei Lopes, o MPT catarinense vai intensificar a fiscalização dessas empresas. “Não vamos exigir nada além do cumprimento da lei”, alerta. A procuradora também esclareceu que os fabricantes não foram convidados porque, em relação a eles, o MPT está propondo uma ação civil pública que tramita na 4ª Vara do Trabalho de Criciúma, a cargo da juíza Zelaide de Souza Philippi, que também participou do evento.

O amianto já foi banido em 66 países, incluindo todos os da União Européia, além de Japão, Austrália, Argentina, Chile, África do Sul, Taiwan, Uruguai e outros. De acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), problemas decorrentes da exposição ao amianto matam em torno de 100 mil pessoas por ano (dado divulgado em 2006). Mesmo a Organização Mundial do Comércio, um dos símbolos do capitalismo global, cuja atividade principal é fortalecer exportações e importações ao redor do mundo, considera que o “uso controlado do amianto não é factível nem nos países desenvolvidos, muito menos naqueles em desenvolvimento”.

O Brasil é o terceiro maior produtor mundial, com 306 mil toneladas anuais, ficando atrás apenas da Rússia e da China. Sete estados, porém, já aprovaram leis eliminando o amianto da cadeia produtiva: Mato Grosso do Sul, São Paulo, Rio de Janeiro, Pernambuco, Rio Grande do Sul, Mato Grosso e Minas Gerais. Com exceção da lei mineira, que concede 10 anos para as empresas se adaptarem, todas as outras legislações estaduais estão tendo sua constitucionalidade contestada no Supremo Tribunal Federal.
 

Poeira tóxica

pesquisador Hermano de CastroA poeira do amianto é considerada altamente tóxica. Quando inalada, provoca doenças respiratórias, incluindo câncer de pulmão e um outro tipo de tumor maligno, o mesotelioma, que atinge a pleura - película que envolve o pulmão. Para o diretor da Escola Nacional de Saúde e pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Hermano de Castro (foto), o amianto é um problema de saúde pública. “Seus malefícios não estão restritos apenas ao setor de mineração, mais exposto à poeira, mas sim em toda a cadeia produtiva”, garante o médico pneumologista, que possui doutorado em saúde pública.

Castro afirmou que desde 1986 trata trabalhadores vítimas da exposição ao amianto. Ao todo, são mais de dois mil pacientes acompanhados pela Fiocruz. “A grande complicação é que não se consegue controlar o risco ao qual o amianto expõe suas vítimas. Basta furar uma telha durante uma obra ou lavar um uniforme sujo com o pó, por exemplo, que o contato pode ocorrer. Ou seja, ele pode estar na mineração, na construção civil e até mesmo na área de serviço da dona de casa”, explica o pesquisador.

Para caracterizar que o risco do amianto chega a ser mais ambiental do que ocupacional, Castro trouxe uma pesquisa da Secretaria de Saúde do Rio Grande do Sul realizada de 1999 a 2003, com pessoas que desenvolveram mesotelioma e tiveram algum tipo de exposição à substância. O resultado mostrou que 61% dos doentes nunca trabalharam nas minas. “Em todos os casos de mesotelioma documentados no Brasil, o doente teve algum tipo de contato com o amianto, direto ou indireto. A questão é tão séria que alguns importadores de frango do Brasil exigem que as telhas dos criadores não contenham essa matéria-prima, e que isso seja rotulado na embalagem”, diz o médico.
 

Qualidade x Saúde

Quem defende o uso do amianto ressalta seu baixo custo e a alta durabilidade e resistência. Para o representante da Federação das Associações dos Comerciantes de Materiais para Construção (Fecomac), advogado Eduardo Bismarck, as telhas sintéticas que estão sendo utilizadas para substituir as de amianto, além de mais caras, são frágeis e vazam com mais facilidade. Ao dizer isso, alguns lojistas na plateia se manifestaram concordando com o advogado.

Bismarck também relativizou os possíveis danos que o amianto causaria à saúde humana. Isso porque o tempo que as doenças demoram para se manifestar a partir da primeira exposição – o chamado período de latência - pode chegar a 40 anos (caso do câncer de pulmão). “Começou com 10, passou para 20 e agora está em 40 anos. Daqui a pouco vamos descobrir que o amianto não provoca câncer”, ironiza.
 

Liderança de mercado

A engenheira Fernanda Giannasi, que presta serviços para a Associação Brasileira de Expostos ao Amianto (Abrea), disse que esse aumento de custo não justificaria comprometer a saúde da população. De acordo com estudo coordenado por ela, quando ainda era pesquisadora da Escola Politécnica da USP, a substituição da crisotila por outras fibras naturais ou sintéticas nas telhas de uma casa popular, de 75 metros quadrados, encareceria a obra em, no máximo, 15%.

“Para comprovar que isso não é um problema real, das 172 empresas que produziam ou comercializavam telhas de amianto no Estado de São Paulo, 170 já fizeram a substituição por outros materiais”, argumenta a engenheira. Duas obtiveram liminares na Justiça e continuam utilizando.

Auditora-fiscal aposentada do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Fernanda Giannasi também refutou qualquer tipo de desconhecimento, por parte das empresas, dos malefícios causados pelo amianto. “Desde a década de 1930 existem relatórios sobre esse assunto. Também é de conhecimento geral que, desde 2005, todos os grandes produtores de fibrocimento já possuem uma linha de produção de telhas compostas de materiais alternativos. O que está em jogo, portanto, é a liderança de mercado”, afirma.

Estudos apontam que ao menos 200 pessoas por ano morrem no país vítimas do amianto, conforme destacou Luciano Leivas, procurador do Trabalho em Santa Catarina e gerente nacional do Programa de Banimento do Amianto no Brasil. Ele lembrou ainda que há um ordenamento jurídico no país que disciplina o aproveitamento econômico da substância. “Precisamos fomentar o debate legislativo sobre o tema”, observa.

Desembargador Amarildo de LimaO desembargador Amarildo Carlos de Lima (foto) disse que o TRT-SC vem acompanhando com bastante atenção as discussões acerca do assunto. “Hoje viemos aqui para ouvir. Há muitos interesses e reflexos de ações judiciais que vão interferir na vida de muita gente”, pondera. Por isso, segundo ele, as decisões judiciais a respeito devem ser bem amadurecidas. “Uma coisa é certa: se já foi proibido em outros estados e países, é porque existem problemas. Por isso, precisamos continuar discutindo”, reforça.

 

obrigações das empresas

 

 


Fonte: Assessoria de Comunicação Social - TRT-SC
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