Ofensas a interesses individuais não geram dano moral coletivo, decide 3ª Turma

Para colegiado, episódios ocorridos em maternidade de Florianópolis foram isolados, sem força para atingir a moral coletiva de todos os trabalhadores

23/07/2024 13h33, atualizada em 24/07/2024 17h58
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A 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (TRT-SC) afastou a existência de dano moral coletivo em ação civil pública (ACP) proposta pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) contra o Estado de Santa Catarina. Para o desembargador-relator da matéria, José Ernesto Manzi, não foi comprovada a ofensa a interesses transindividuais, ou seja, interesses que ultrapassam o âmbito individual e que acabam afetando um grupo de pessoas.

O MPT acolheu denúncia, em dezembro de 2021, sobre episódios de intimidação, humilhação e coação de trabalhadores por gestores da Maternidade Carmela Dutra, na capital, o que poderia configurar assédio moral. A unidade está vinculada à Secretaria do Estado da Saúde de Santa Catarina.

De acordo com testemunhas, a tensão entre a direção e corpo funcional atingiu patamares elevados em razão de desentendimentos sobre os protocolos instituídos pela própria maternidade no atendimento ao público durante a pandemia de covid-19.

O MPT propôs, inicialmente, um Termo de Ajuste de Conduta (TAC). Porém, o Estado de Santa Catarina não reconheceu as irregularidades e não assinou o compromisso, levando assim ao ajuizamento da ação na Justiça trabalhista.

 

Conduta omissiva

 

O processo teve início em maio de 2023, na 6ª Vara do Trabalho de Florianópolis. Em sua defesa, o Estado alegou a incompetência da Justiça do Trabalho para apreciação da matéria, com base no princípio da separação entre os Poderes, cerceamento de defesa, inadequação da via escolhida e ausência do interesse de agir.

Todas as hipóteses foram rejeitadas pelo juízo de primeiro grau, uma vez que a matéria em debate não se referia ao controle de conveniência e oportunidade dos atos praticados pela administração pública (Poder Executivo), mas sim ao controle de conduta omissiva, potencialmente ilegal ou abusiva com a finalidade de zelar pelo ambiente laboral. Também ficou demonstrado ao longo do processo o respeito ao contraditório e ampla defesa, além da conformidade em relação à proposição da ACP.

Após a análise e coleta dos depoimentos, o juízo considerou a existência de dano moral coletivo, fixando indenização no valor de R$ 500 mil, além de multa diária de R$ 10 mil sobre o descumprimento de quaisquer das obrigações determinadas na sentença. Entre elas: não praticar condutas vexatórias, humilhantes ou de abuso do poder diretivo; adotar medidas para prevenir práticas discriminatórias ou de assédio no ambiente de trabalho, como canais de denúncia, fiscalização e a realização de treinamentos, cursos e palestras sobre o assédio moral nas relações de trabalho.

 

Episódios isolados

 

O Estado de Santa Catarina recorreu ao tribunal com base nos mesmos argumentos afastados pelo juízo de origem. O desembargador José Ernesto Manzi, relator do processo, manteve parte do entendimento do primeiro grau, além da condenação referente às obrigações. Entretanto, por unanimidade, a 3ª Turma excluiu o pagamento da indenização por danos morais coletivos, bem como a multa diária fixada na sentença, por entender que não houve a configuração de dano moral coletivo.

No acórdão, o relator avaliou que o embasamento do dano recaiu quase exclusivamente sobre um fato ocorrido com uma enfermeira, sendo apresentados de maneira complementar outros fatos isolados, “sem força suficiente para comprovar a prática acintosa e deliberada dos prepostos do empregador capazes de atingir a moral coletiva de todos os trabalhadores”.

O desembargador argumentou ainda não ser “qualquer situação desagradável que o caracteriza, sendo necessária a ocorrência de fato que cause repulsa coletiva, intolerância social, sensação de indignação ou opressão coletiva; de dano irreversível ou de difícil reparação; e lesão que provoque consequências históricas para a coletividade, com o rompimento do seu equilíbrio social, cultural e patrimonial, afetando o sentimento de respeito que a sociedade tem por determinados valores”.

Manzi também fundamentou que para a configuração de assédio moral, conforme requerido pelo MPT, seria necessário que a conduta fosse reiterada e prolongada no tempo, com a intenção de desestabilizar emocionalmente algum funcionário. “Episódios isolados podem até caracterizar dano moral, mas não necessariamente configuram assédio moral”, justificou.

Além da inexistência do dano moral coletivo, a revisão relativa ao pagamento, segundo o relator, visou “impedir que por conta da conduta de um potencial mau-gestor, o orçamento público seja destinado a outras finalidades que não aquelas que deveriam ser privilegiadas, por escolha de agentes políticos não-eleitos, mesmo que bem intencionados”, considerando o impacto gerado sobre a Fazenda Pública.

As partes ainda podem recorrer da decisão.


Nº do processo: ROT 0000411-71.2023.5.12.0036
 


Texto: Camila Collato
Secretaria de Comunicação Social 
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