A Companhia de Energia Elétrica do Estado de Tocantins (Celtins) terá que se abster de utilizar mão de obra, através de outra empresa, para suas atividades-fim, devendo contratar diretamente os trabalhadores necessários. Por decisão da Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, ao julgar recurso da Celtins, apenas as obras de topografia, serviços de atendimento a clientes pessoalmente e por telefone - inclusive por meio de agências de atendimento e “telemarketing” - e serviços de poda de árvores, cuja execução poderá ser transferida a terceiros, foram excluídas do conceito de atividade-fim
O recurso de revista julgado ontem (9) pela Primeira Turma é resultado de uma ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho da 10ª Região. Na primeira instância, além do impedimento quanto à terceirização, a empresa foi condenada a pagar uma indenização por danos extrapatrimoniais coletivos no valor de R$200 mil, reversível ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), além de ter sido fixada multa de R$ 10 mil por dia de descumprimento da obrigação de não fazer. A Celtins recorreu da sentença, mas o Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (DF/TO) negou provimento ao recurso ordinário, o que motivou a empresa a recorrer ao TST.
A Celtins alega que houve contratação de terceiros para atividades inerentes, acessórias ou complementares ao serviço concedido, com base na Lei 8.987/95, que, segundo ela, autoriza a terceirização de atividades-fim pelas concessionárias de serviço público. Não foi esse o entendimento da Primeira Turma nem do relator do recurso de revista, ministro Walmir Oliveira da Costa, para quem a questão central debatida no processo refere-se ao sentido da expressão “atividades inerentes”, que consta no parágrafo primeiro do artigo 25 da Lei 8.987/95.
De acordo com o ministro Walmir, ao se visar à incidência da norma nas relações de trabalho e se considerar os princípios constitucionais da valorização do trabalho e da dignidade humana, a interpretação para o que está disposto na Lei 8.987/95 conduz à conclusão de que a contratação de terceiros somente pode ser realizada em “parcela acessória ou não essencial ao contrato, ou seja, atividades-meio”. No mesmo sentido foi o pronunciamento do ministro Lelio Bentes Corrêa, presidente da Primeira Turma, para quem, “se o legislador tivesse a intenção de permitir a terceirização de atividades essenciais no setor elétrico, não teria adotado a expressão atividades inerentes”, pois, se quisesse, tinha um conceito técnico à disposição e o teria utilizado expressamente.
O relator observou que a Norma Regulamentar nº 10 do Ministério do Trabalho e Emprego fornece elementos que possibilitam definir quais são as atividades essenciais no setor de energia elétrica: geração, transmissão, distribuição e consumo, incluindo as etapas do projeto, construção, montagem, operação, manutenção. Partindo dessa delimitação, o ministro Walmir propôs a exclusão, dentre essas atividades, de obras de topografia e de serviço de atendimento ao cliente. O ministro Vieira de Mello Filho defendeu uma lista mais abrangente e ficou vencido. Ao final, por maioria do colegiado, acabou por ser inserida, entre as atividades de execução por terceiros, também a poda de árvores.
Precarização
Diversos parâmetros e estudos embasaram a decisão da Primeira Turma. No julgamento, que durou mais de uma hora e meia, o relator citou estudos do Dieese, referentes à precarização da mão de obra no serviço público de energia elétrica, em que se verifica que “a terceirização no setor elétrico mata um trabalhador a cada 14 dias”. Além disso, afirmou o ministro, “mais da metade da força de trabalho do setor elétrico do país é terceirizada, e a incidência de mortes no trabalho para os terceirizados supera em três vezes a de trabalhadores diretamente contratados pelas concessionárias”.
O ministro Walmir ressaltou, ainda, a importância da diretriz contida no item I da Súmula 331 do TST, que, na falta de lei específica, disciplina as hipóteses de terceirização nas relações de trabalho. Ao estabelecer a ilegalidade da contratação de trabalhadores por empresa interposta, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário, a súmula, entende o relator, “teve em mira que a ordem econômica estabelecida na Constituição funda-se na valorização do trabalho e na livre iniciativa, tendo por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social”.
Para o ministro Vieira de Mello, relator na Seção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) de um processo envolvendo concessionária de energia elétrica, no qual defendeu a aplicação da Súmula 331, deve-se “observar o equilíbrio entre a livre iniciativa e o valor do trabalho humano na interpretação judicial e na formação dogmática e doutrinária”. O ministro Vieira expressou sua preocupação pelo fato de a transferência do serviço público precarizar as relações de trabalho, na medida em que a terceirização acarreta redução ou diminuição de direitos trabalhistas dos empregados “terceirizados”.
(RR - 27500-89.2005.5.10.0801)
Fonte: Tribunal Superior do Trabalho