As 63 propostas (61 principais e duas apensadas) aprovadas na plenária do 1º Fórum de Direito Material e Processual na Justiça do Trabalho, realizado de 05 a 07 de novembro, irão subsidiar a Comissão de Uniformização de Jurisprudência do TRT/SC na formulação de súmulas para serem levadas aos 18 juízes que compõem o Tribunal Pleno da instituição. Juízes e procuradores do trabalho, além de advogados e bacharéis em Direito discutiram diversos temas sobre o Direito do Trabalho. Confira a seguir algumas das propostas aprovadas que poderão vir a se tornar súmulas.
Tutela antecipada de ofício
Nada mais é do que a antecipação de um direito, pelo juiz, a uma das partes envolvidas na ação antes do julgamento do mérito. De ofício, porque o próprio juiz pode antecipar esse direito sem que a parte precise fazê-lo por requerimento ou petição. Durante a discussão na comissão temática “Direitos Fundamentais e as Relações do Trabalho”, a juíza do trabalho substituta Ângela Maria Konrath, autora do enunciado, disse que a proposição sugere uma postura mais ativa do magistrado diante dos problemas que são apresentados. A proposta visa também a “uma melhor distribuição do ônus do tempo no processo”, destaca a juíza Ângela, evitando que o possuidor do direito não seja muito prejudicado pela demora em recebê-lo.
Ambos os debatedores da comissão, juízes titulares da 3ª VT de Jundiaí/SP e da 89ª VT de São Paulo, Jorge Luiz Souto Maior e Marcos Neves Fava, respectivamente, aprovaram o enunciado. Para Souto Maior, a proposta é extremamente relevante e não agride o Direito. “O fundamento para isso é que o Direito do Trabalho está ligado a questões de ordem pública e portanto não pode estar restrito à manifestação da parte”, argumenta o juiz, também professor da Universidade de São Paulo.
A juíza titular da 2ª VT de Blumenau, Maria Beatriz Gubert, manifestou-se a favor. “Comecei a conceder tutelas de ofício e percebi que funciona muito bem. Acho que é mais um instrumento para garantir a efetividade e a duração razoável do processo”, afirmou. Já o juiz do trabalho substituto Jayme Ferrolho Junior entende que tal medida afronta o texto legal (art. 273 do Código de Processo Civil - a tutela será deferida a requerimento da parte). “O objetivo é interessante, mas não podemos ficar contrariando a lei toda a vez que possuímos um entendimento diferente. Se o legislador quisesse que o juiz tivesse esta faculdade, não teria incluído a exceção no artigo”, justifica. A juíza Ângela defendeu a proposta, alegando que não existe afronta ao dispositivo porque há no enunciado “um apelo para que se observe os requisitos legais presentes no art. 273 do CPC”.
O estudante de Direito e servidor da VT de Caçador Marinho Dembinski Kern acompanhou atento às discussões. Ele considerou o Fórum uma oportunidade de conhecer o pensamento do juízes do TRT/SC. “Eu não sabia da possibilidade de antecipação de tutela de ofício, mesmo já tendo cursado as disciplinas de Direito do Trabalho e Processo Civil. Essa foi uma das propostas que mais me chamou atenção”, disse Marinho, que participou do evento como ouvinte.
Comissão de conciliação prévia
Outra proposta debatida na mesma comissão e aprovada na plenária foi a que prevê a dispensa de trabalhador de passar por uma comissão de conciliação prévia antes de ingressar com ação na Justiça do Trabalho. As comissões de conciliação prévia foram criadas há oito anos, pela Lei n. 9.958/2000, e tinham por objetivo desafogar a Justiça do Trabalho: o trabalhador, para ingressar com uma ação trabalhista, teria que tentar um acordo nessas comissões.
O que se começou a questionar, no entanto, foi o fato de as comissões funcionarem dentro das empresas, ou seja, num ambiente longe da neutralidade. Ao mesmo tempo, a própria lei passou a ser questionada no Supremo Tribunal Federal, pois não se pode criar uma instância que restrinja o acesso do trabalhador à Justiça. Segundo Souto Maior, o enunciado, de autoria do servidor Mário Alfeu Wiethorn Lemos, do juiz do trabalho da VT de Fraiburgo, José Carlos Külzer, e do advogado Manoel Aguiar Neto, garante o acesso à justiça como direito fundamental sem obstáculo. A proposta também recebeu o aval do debatedor Marcos Neves Fava.
Negociação coletiva
Na comissão “Lides Sindicais e Direito Coletivo”, a proposta mais polêmica e debatida pelos participantes tratou da negociação coletiva. Para o debatedor Francisco Rossal de Araújo, juiz titular da 16ª VT de Porto Alegre, a negociação coletiva tem de apontar melhorias nas condições de trabalho, no entanto, servem também para adaptar o Direito do Trabalho às flutuações da economia. “A idéia central é não retroceder. Toda vez que o trabalhador tiver alguma perda, tem de haver uma contrapartida proporcional. Não existe contrato que um só ganhe”, explicou Rossal, professor da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos)
Duração do trabalho
A proposta apensada da juíza substituta Zelaide de Souza Philippi sobre a invalidade do uso do banco de horas em atividade de processamento de carnes gerou polêmica na comissão “Tutelas Específicas”. A discussão gerou em torno da especificidade da proposta. Para a juíza Zelaide, caso fosse retirada a referida atividade, o objetivo do enunciado seria desvirtuado. O juiz titular da 18ª VT de Curitiba, Cassio Colombo Filho, debatedor na comissão, manifestou-se contrário à limitação.
“A idéia não é atingir um setor específico, mas sim uma orientação geral como a da lei”, argumentou. A juíza titular da 1ª VT de Chapecó, Vera Marisa Vieira Ramos, defendeu a proposta da colega. Segundo a magistrada, o banco de horas autoriza que trabalhadores permaneçam em seus postos de trabalho, além da jornada. No caso específico dos frigoríficos, o trabalho intenso e repetitivo nas linhas de produção é propício ao aparecimento de doenças”, explicou a juíza Vera Maria, enfatizando que essa é uma realidade do meio-oeste e oeste catarinense.
Relação de consumo x relação de trabalho
Outra proposta aprovada nessa comissão privilegia o caráter de hipossuficiência do trabalhador na prestação de serviços, afastando da competência da Justiça do Trabalho relações de trabalho que sejam derivadas de uma relação de consumo. “Esta proposta reitera que o foco da Justiça do Trabalho é o trabalhador hipossuficiente, menos favorecido financeiramente. Por exemplo, se um cirurgião plástico não receber pelo serviço prestado, a competência não é da justiça trabalhista, pois esse profissional possui outras fontes de renda, diferente daquele trabalhador que vende sua força de trabalho”, reforçou a juíza Vera Marisa, autora do enunciado.