Moralismo jurídico ameaça força vital da Constituição, adverte jurista

14/06/2019 08h50, atualizada em 04/11/2019 14h19
Ruy Samuel Espíndola fala na Escola Judicial sobre questões constitucionais
Palestrante criticou discurso que vê Judiciário como indutor de mudanças na CF: "o próprio texto deve ser o limite da interpretação", defendeu.

 

A ideia que os órgãos do Poder Judiciário devem “aperfeiçoar” as leis vigentes no país por meio de suas decisões é perigosa e precisa ser revista, afirmou nesta quinta (13) o professor de Direito Constitucional e advogado Ruy Samuel Espíndola. O jurista esteve em Florianópolis onde palestrou para cerca de 80 juízes e desembargadores da Justiça do Trabalho catarinense, em evento promovido pela Escola Judicial do TRT-SC (Ejud12).

Espínola abordou o que classificou como moralismo contra constituicione, ou seja, o discurso de que as decisões judiciais poderiam relativizar normas da Constituição em nome de um propósito moral maior — como por exemplo, o combate à corrupção. Em sua avaliação, a visão moralista é equivocada e ajuda a desconstruir a cultura de obediência às normas constitucionais, ainda recente no Brasil.

"Estamos num momento de ruptura, de desconstrução da nossa forma de interpretar a Constituição", alertou, citando decisões envolvendo a Lei da Ficha Limpa e a possibilidade de prisão após decisão de segunda instância. "Os juízes devem ser os principais guardiões da lei, eles não podem ser pressionados a tomar uma decisão num determinado sentido se o texto da Constituição diz o contrário", ponderou.

Protagonismo e exposição

Segundo o especialista, uma das consequências do fenômeno do moralismo jurídico é a supervalorização das decisões judiciais em detrimento do debate legislativo, o que induz os magistrados a invadir a competência dos demais poderes — e, com isso, ficarem expostos à pressão de grupos e das circunstâncias. Um dos exemplos utilizados pelo orador foi o da decisão da Justiça Federal que impediu a posse da deputada Cristiane Brasil como ministra do Trabalho, no ano passado.

"É preciso abandonar a ideia de que um magistrado pode fazer algo contra o texto da Constituição em nome de um bem maior", propôs, criticando a decisão. "Uma coisa é a minha vontade política de que algo mude; outra coisa é o que efetivamente está na Constituição. É o próprio texto da norma que deve estabelecer o limite de sua interpretação", disse.

Mestre em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina, o convidado usou a Lei da Ficha Limpa como exemplo da insegurança gerada pelo moralismo jurídico. "Desde que a lei entrou em vigor, mais de 3 mil mandatos já foram cassados em todo o país, algo que nem a ditadura conseguiu fazer. Isso tudo fragilizou muito o processo eleitoral", destacou, defendendo uma leitura mais dogmática da Constituição. "Vivemos num mundo que reclama a justiça assegurada pelos princípios, mas se esquece da segurança jurídica, que é garantida pela existência de regras", concluiu.

 

 
Texto e fotos: Fábio Borges
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