Verdade nua e crua

Para desembargadora Lourdes Leiria, trabalho infantil em Santa Catarina é uma realidade que precisa ser assumida e combatida o quanto antes

05/06/2014 18h34
Desembargadora Lourdes Leiria na EJUD
Magistrada é gestora regional do Programa de Combate ao Trabalho Infantil da Justiça do Trabalho


“Nunca mais recuarei diante da verdade, pois quanto mais tardamos a dizê-la, mais difícil torna-se aos outros ouvi-la”. A frase de Anne Frank iniciou a palestra da desembargadora Maria de Lourdes Leiria sobre o Programa Nacional de Combate ao Trabalho Infantil do TST, proferida na manhã desta quinta-feira (5), durante o terceiro módulo de 2014 da Escola Judicial do TRT-SC, que tem por objetivo a capacitação e o aperfeiçoamento contínuo de magistrados. O evento está sendo realizado num hotel de Florianópolis e segue até sexta-feira (6).

A magistrada, gestora regional do Programa, explicou que escolheu a autora judia pela data de seu nascimento, 12 de junho, Dia Mundial de Combate ao Trabalho Infantil - neste ano, em razão da abertura da Copa do Mundo, a data foi transferida para o dia 3. “O trabalho infantil em Santa Catarina é uma verdade, que nos custa acreditar, mas que tem que ser assumida e combatida o quanto antes”, assinalou.

Munida de dados e estatísticas sobre o tema – os quais considera serem superiores na realidade -, a desembargadora apresentou aos colegas a real face dessa mazela social em nosso estado. “Em Santa Catarina há 120 mil crianças que trabalham, inclusive nas piores formas de trabalho infantil classificadas pela OIT (Organização Internacional do Trabalho), como o doméstico e o agrícola”, alertou.

Para a magistrada, a principal maneira de combater o problema é investir na educação, principalmente dos pais. “Muitos pensam que, pelo fato do filho ir à escola em outro turno, a criança não é considerada uma trabalhadora. Em Santa Catarina o trabalho doméstico é realizado por 5 mil crianças. Os pais pensam que a criança está protegida, ‘ganhando casa’, quando na verdade está exposta a diversas situações degradantes, como esforço repetitivo, queimaduras e assédio moral e sexual, que vão marcar a vida dela para sempre”, apontou.

A desembargadora encerrou conclamando os magistrados a se engajarem à causa. “Tem que haver um comprometimento do Poder Judiciário para que sejam criadas políticas públicas que garantam os direitos fundamentais previstos na Constituição. Como formadores de opinião, devemos lutar para mudar a mentalidade de parte da sociedade de que o trabalho infantil dignifica. Pelo contrário, ele viola. Ferramenta de criança é lápis”, concluiu.
 

Trabalho Seguro

Juíza Desirré BollmannOutro programa desenvolvido nacionalmente pelo TST, o Trabalho Seguro, também foi abordado na parte da manhã. A palestra ficou a cargo da juíza Desirré Bollmann (foto), titular da 2ª VT de Blumenau e gestora regional auxiliar do Programa. A magistrada também destacou a necessidade dos juízes irem além do papel de aplicador da lei para atuar na construção de políticas públicas que garantam os direitos constitucionais, como a segurança do trabalhador.

“O juiz não pode ser neutro diante de situações em que haja a violação das garantias previstas na Constituição. Ele tem compromisso com os princípios do Estado Democrático de Direito e é responsável pela aplicação das garantias constitucionais. A sociedade clama para que o Judiciário seja mais efetivo, saindo da posição inerte e atuando como protagonista”, afirmou.

A magistrada também apontou a educação como ferramenta fundamental para mudar a realidade. “Na maioria das vezes, o próprio trabalhador não está consciente da importância de se ter segurança no ambiente de trabalho. Temos que nos mobilizar para mudar esse quadro e, através do Programa Trabalho Seguro, estamos conseguindo avançar nessa questão em nosso Estado”, disse a juíza, citando a edição da Lei 16.003/13, que tornou obrigatória a inclusão, nos editais de licitação lançados pelo Governo de SC, de uma cláusula que exija a capacitação dos trabalhadores contratados em saúde e segurança do trabalho.

O projeto que originou a citada legislação, aprovada em abril de 2013, foi encaminhado pelo deputado Gelson Merísio a pedido dos gestores regionais do Programa Trabalho Seguro do ano passado, a desembargadora Gisele Alexandrino e o juiz Alexandre Ramos.
 

Palavra de especialista

Professor Leonel SeveroAntes das palestras das magistradas, quem abriu os trabalhos foi o professor Leonel Severo Rocha (foto), que falou sobre “Cidadania do mundo do trabalho e trabalho decente – O papel do juiz na efetividade dos direitos da cidadania”.

“O trabalho é uma relação social indispensável para a organização da sociedade. Não se pode pensar numa sociedade desenvolvida sem que o trabalho já esteja plenamente estabelecido”, assinalou o especialista, pós-doutor em sociologia do Direito. “O juiz do trabalho exerce um papel fundamental para que haja equilíbrio nessas relações entre as partes envolvidas e os direitos fundamentais sejam garantidos”, afirmou.

A programação seguiu pela tarde desta quinta com um painel sobre o tema “Meios processuais e administrativos para efetividade dos direitos fundamentais”, apresentado por três participantes: Rodrigo de Lacerda Carelli, procurador do trabalho do MPT/RJ, que falou sobre tutela inibitória coletiva; Cassio Colombo Filho, desembargador do TRT/PR, abordou tutela de urgência; e Mauro Marques Müller, auditor-fiscal do trabalho, a interdição de empresas.

Ao final, foi realizada uma dinâmica sobre o papel da Escola Judicial no contexto das mudanças, coordenada pela consultora Dilsa Mondardo.

 

 

Fonte: Assessoria de Comunicação Social - TRT-SC
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