Bolsa Família só deveria ser concedido a lares onde não existe trabalho infantil, defende 'Dama da Liberdade'

Responsável por libertar mais de 2 mil trabalhadores em condições análogas à escravidão, auditora Marinalva Dantas foi uma das atrações de evento que debateu exploração de crianças e adolescentes nas cadeias produtivas

23/08/2016 16h32
Marinalva Dantas falando ao microfone
Marinalva Dantas luta pela causa há 23 anos

 

O Governo deveria aprimorar o Programa Bolsa Família de forma a garantir a transferência de renda apenas a famílias onde não há crianças trabalhando. “Se a criança estuda e trabalha ao mesmo tempo, o aprendizado não é absorvido, e o resultado é um exército de semianalfabetos, como temos constatado nas fiscalizações”, afirma a auditora-fiscal do trabalho Marinalva Dantas, cujo trabalho ajudou a libertar 2,3 mil trabalhadores em condições semelhantes à escravidão. No Brasil, a idade mínima para trabalhar é 16 anos, e atividades como o trabalho doméstico ou em plantações só é permitido aos 18 anos.

A “Dama da Liberdade”, como é conhecida, foi uma das atrações do painel “Não ao trabalho infantil nas cadeias produtivas”, ao lado do procurador do trabalho Rafael Dias Marques. O evento foi promovido pelo Fórum de Erradicação do Trabalho Infantil de Santa Catarina (Feti/SC), do qual o TRT-SC faz parte, e pelo Fórum Catarinense de Aprendizagem Profissional (Focap), na noite de terça (23), no auditório do Tribunal de Justiça de Santa Catarina.

Em entrevista concedida à equipe da Secretaria de Comunicação Social do TRT-SC, momentos antes do evento, Marinalva disse estar “impaciente” com a dificuldade de erradicar o trabalho infantil no país, luta na qual está envolvida há 23 anos. De acordo com ela, o momento exige estratégias articuladas para tornar menos lucrativa a exploração de crianças na cadeia produtiva, inclusive com a aplicação de multas mais elevadas.

Rafael Marques falando ao microfonePara Rafael Marques (foto), falta ao Brasil uma legislação específica que responsabilize de maneira mais clara e direta a empresa por violações de direitos humanos cometidas ao longo de sua cadeia produtiva. A busca incessante pela redução de custos, segundo ele, faz com que as empresas diluam cada vez mais sua produção em etapas que, ao final da cadeia, acabam utilizando baixa tecnologia e muita atividade artesanal. “Nessas situações o controle e a fiscalização são mais fluídos, e abre-se espaço para que o trabalho degradante alcance as famílias”, disse Marques, que coordenou o Programa Nacional de Combate à Exploração do Trabalho de Crianças e Adolescentes de 2010 e 2015.

Na abertura do evento, o procurador-chefe do Ministério Público do Trabalho em Santa Catarina, Marcelo Goss Neves, lembrou que o trabalho infantil na cadeia produtiva ainda é mais grave porque fica oculto no resultado final de uma bela confecção, de uma carne embalada no supermercado ou numa carteira de cigarro.

“São atividades desenvolvidas por jovens no contato direto com animais, agrotóxicos e maquinário pesado, longe dos olhos dos tribunais, dos sindicatos e do Ministério Público, e que caracterizam algumas das piores formas de trabalho infantil”, afirmou o procurador, que também coordena o Focap.

Desembargadora Mari Eleda falando ao microfone

Representando a Presidência do TRT-SC, a desembargadora Mari Eleda (foto)destacou o trabalho que vem sendo desenvolvido pelo MPT e pelo Programa de Combate ao Trabalho Infantil da Justiça do Trabalho, coordenado em Santa Catarina pela desembargadora Lourdes Leiria, que também compôs a mesa de abertura do evento. “Espero que todas essas ações que vêm sendo realizadas sirvam para engajar cada vez mais os magistrados nessa importante causa”, conclamou Mari Eleda, vice-presidente do Tribunal e diretora da Escola Judicial da instituição.

 

 

 

Texto e fotos: Clayton Wosgrau
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