Para Kazuo Watanabe, mudanças legislativas não resolvem crescimento da litigiosidade

Jurista será um dos destaques do segundo módulo da Escola Judicial, que acontece de 21 a 23 de junho em Florianópolis

13/06/2017 13h50
Kazuo Watanabe
Watanabe falará a magistrados e assessores do TRT-SC sobre litigiosidade e Constituição Federal


O jurista e escritor Kazuo Watanabe será uma das atrações do segundo módulo de estudos da Escola Judicial do TRT-SC, que acontece de 21 a 23 de junho no auditório da sede da Esteves Junior, em Florianópolis. O evento é voltado a magistrados e assessores de juízes e desembargadores do Tribunal. Doutor em Direito pela USP e desembargador aposentado do Tribunal de Justiça de São Paulo, Watanabe tem vasta atuação jurídica, participando inclusive da comissão do Ministério da Justiça responsável por revisar o Código de Processo Civil.

A palestra de Watanabe será no dia 21 sobre “Litigiosidade e Constituição Federal”. Como um aperitivo da apresentação, a Secretaria de Comunicação Social do TRT-SC enviou ao jurista três perguntas por e-mail. Veja o que ele respondeu.

Na visão do senhor, a Constituição Federal favorece ou desmotiva a resolução alternativa de conflitos? Por qual razão?

Kazuo Watanabe: A nossa Constituição Federal acolhe o princípio da solução adequada dos conflitos de interesses e estimula a solução amigável das controvérsias. O princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, inscrito no inciso XXXV do art. 5º da CF, não assegura mero acesso aos órgãos do Poder Judiciário, e sim acesso qualificado que propicie a tutela efetiva, tempestiva e adequada.

O princípio da adequação dos meios de solução dos conflitos vem provocando a atualização do princípio de acesso à justiça, o que conduziu o Conselho Nacional de Justiça à edição da Resolução 125/2010, que institui a Política Judiciária Nacional de Tratamento Adequado dos Conflitos de Interesses.

Além do mais, a nossa Constituição Federal, no plano internacional, adota expressamente o princípio da “solução pacífica dos conflitos” (art. 4º, VII). E no plano interno, ao cuidar do sistema de justiça, menciona expressamente a “conciliação” no art. 98, inciso I, ao cuidar das causas cíveis de menor complexidade. E no mesmo dispositivo, no inciso II, determina a criação da “Justiça de Paz” com “atribuições conciliatórias, sem caráter jurisdicional”.

Em suma, a Constituição não só favorece como também estimula a adoção dos mecanismos ditos “alternativos” (hoje, chamados de “adequados”) de solução de controvérsias, em especial os meios consensuais, como a mediação e a conciliação.

A redução da litigiosidade no Judiciário depende de mudanças legislativas? Se não, qual o caminho?

Kazuo Watanabe: As mudanças legislativas não resolvem a crise de desempenho de nossa Justiça. São várias as causas dessa crise e uma delas é certamente a explosiva litigiosidade. A litigiosidade tem inúmeras causas, que devem ser estudadas em profundidade. Uma delas é, certamente, a chamada “cultura da sentença”, que privilegia a solução dos conflitos de interesses pela autoridade estatal, que é o juiz de Direito.

É a cultura que predomina entre os profissionais do direito e entre os próprios jurisdicionados, o que faz com que os conflitos de interesses sejam imediatamente judicializados, sem se tentar previamente sua solução negociada e amigável. Essa cultura está comprometendo seriamente a política de tratamento adequado dos conflitos de interesses, pois muitos juízes, com alegações variadas, recusam-se a realizar a audiência prévia de conciliação adotada pelo novo Código de Processo Civil.

De acordo com o relatório Justiça em Números, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em 2015 o índice de conciliação no Brasil foi de 11%. Em uma entrevista concedida em 2014 para o site Consultor Jurídico, o senhor afirmou que nos Estados Unidos menos de 5% dos conflitos vão para julgamento final. O que explica essa diferença?

Kazuo Watanabe: Os Estados Unidos adotaram os mecanismos “alternativos” de resolução de controvérsias (ADR) na década de 1970 e vêm investindo nessa política desde então. E eles o fazem com toda a seriedade, com envolvimento da Justiça, das Universidades, dos professores e pesquisadores, profissionais do Direito e de disciplinas afins. Eles têm já consolidada a cultura da solução negociada e consensual de controvérsias. Não é possível comparar os dados estatísticos deles com os nossos, pois os sistemas processuais dos dois países são bastante distintos.

Não temos, por exemplo, o júri para a resolução dos conflitos de natureza civil, como tem o sistema americano. Os custos de demandas judiciais são muito mais elevados nos Estados Unidos. O sistema de colheita de provas do sistema americano é muito mais complexo e custoso que o brasileiro. Todas essas diferenças certamente determinam a melhor aceitação pelos litigantes americanos de mecanismos alternativos de solução de controvérsias. Mas, de qualquer modo, é impressionante o dado estatístico: menos de 5% das controvérsias vão até o julgamento final.

Se conseguirmos emplacar a “cultura da pacificação”, da aceitação dos mecanismos consensuais de solução de controvérsias, aumentando o índice de soluções amigáveis, em especial na fase pré-processual, antes do ajuizamento dos conflitos, estaremos certamente resolvendo em parte a crise de desempenho de nossa Justiça.
 

 

 

 


Texto: Carlos Nogueira / Foto: Tibunal Regional Federal da 3ª Região
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