Painel reforça necessidade de regulamentação de greve no serviço público

03/05/2012 15h55

A regulamentação do direito de greve para servidores públicos foi um dos temas discutidos no Seminário sobre Liberdade Sindical e Novos Rumos do Sindicalismo no Brasil, realizado nos dias 26 e 27/4 no Tribunal Superior do Trabalho. O painel sobre o assunto – "Direito de greve e negociação coletiva no setor público. Implementação da Convenção 151 da OIT no Brasil" – reuniu o senador Aloysio Nunes Ferreira, autor de projeto de regulamentação em tramitação no legislativo, e o juiz Ingo Wolfgang Sarlet, do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul.

Projeto de Lei

Aloysio Nunes Ferreira apresentou aos participantes o Projeto de Lei 710/ 2011, cujo objetivo, segundo ele, é o de preencher uma lacuna legal existente na Constituição da República, que, a despeito de consagrar o direito de greve ao servidor público (artigo 37, inciso VII), condicionou-o à promulgação de norma posterior. Em sua versão original, a Constituição exigia que a regulamentação se desse por meio de lei complementar. Posteriormente, com a Emenda Constitucional nº 19/1998 (Reforma Administrativa), foi estabelecido que a regulamentação se faria por meio de lei ordinária.

O senador lembrou também que o PL veio na esteira de decisão do Supremo Tribunal Federal em julgamento de mandados de injunção sobre o tema (MIs 670, 708 e 712) ajuizados por sindicatos de servidores públicos, no sentido de que, na ausência de regulamentação, valem as regras previstas na Lei nº 7.783/1989 (Lei de Greve).

Para Aloysio Ferreira, o exercício de direito de greve no setor privado, regido pela CLT, castiga fundamentalmente o "bolso do capitalista", pois afeta a produtividade. No setor público, porém, a greve pune a sociedade civil, pois o "patrão", em primeiro plano, é o órgão público no qual o movimento é deflagrado, mas a repercussão da paralisação afeta de forma nociva a população .

O confronto, ressaltou o senador, ocorre entre o servidor e a administração pública. Desse modo, é necessário refletir sobre como uma negociação coletiva, com reflexos financeiros e feita em esfera administrativa, poderia vincular iniciativa que a Constituição atribui, exclusivamente, ao Poder Executivo, ou até que ponto o Congresso Nacional encontra-se obrigado a aceitar proposta do Executivo ou decorrente de medida judicial se há imposição da observância, pelo gestor público, de limites orçamentários previamente aprovados.

Com vistas a conciliar o direito do servidor público com o da sociedade, que, em última análise, remunera o agente público, o PL não considera como servidores públicos os membros dos três Poderes e do Ministério Público e exclui as Forças Armadas, Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares. Também classifica como atividades essenciais os serviços que afetem a vida, a saúde e a segurança dos cidadãos, como assistência médico-hospitalar e ambulatorial, distribuição de medicamentos de uso continuado pelo SUS, produção e distribuição de energia, gás e combustíveis, segurança pública, transporte coletivo e serviços judiciários, entre outros. Para cada uma delas o projeto prevê percentuais mínimos a serem mantidos durante a paralisação para que a greve seja declarada legal.

A deflagração de greve, nos termos propostos, deve seguir pré-requisitos como aprovação em assembleia geral, com indicativo de interrupção dos serviços, notificação ao Poder Público, instalação de mesa emergencial de negociação coletiva, processos alternativos de solução de conflitos e, no caso de ausência de acordo integral, será instado o Poder Judiciário. Somente quando esgotadas e demonstradas as possibilidades de negociação será possível a deflagração do movimento grevista, após comunicação às autoridades superiores, apresentação de planos de continuidade dos serviços e de alternativas de atendimento ao público e informação à população sobre a paralisação e as reivindicações feitas.

O senador destacou a forma encontrada no projeto para solucionar a questão, sempre delicada, do pagamento de dias parados. A princípio, a previsão é a de suspensão do pagamento, admitindo-se, no entanto, e limitado 30% do período da paralisação, a remuneração do período não trabalhado, no caso de ter havido previsão expressa de compensação na negociação coletiva ou em outros instrumentos. Igual procedimento foi adotado para a contagem dos dias para fins de tempo de serviço.

Direito fundamental

O segundo participante do painel, Ingo Wolfang Sarlet, que abordou o assunto sob a perspectiva do direito constitucional e dos direitos fundamentais, afirmou que a greve no serviço público é direito fundamental que já nasceu polêmico. Há países que a proíbem, mas a Constituição brasileira segue uma linha que vem crescendo em constituições recentes, especialmente latino-americanas, e reconhece o direito de greve do serviço público.

Segundo ele, não foi por acaso que a greve foi contemplada num capítulo próprio, pois o nosso constituinte, ao contrário de outras constituições, quis realmente assegurar ao regime do serviço público e da administração pública todo um conjunto de princípios e regras diferenciado. O direito de greve do servidor público, assim, é um dos melhores exemplos de como no Brasil a diferença entre direitos humanos e fundamentais é vital, e é essencial que seja compreendida.

O juiz observou que a nossa Constituição nada diz a respeito do sujeito do direito de greve, mas nenhum servidor público está excluído de ser titular dele. "O STF, ao definir a orientação a esse respeito, conseguiu fazer uma interpretação provisória, mas poderosa, conciliando o direito de greve com o direito fundamental e a necessidade de correções tópicas, a depender no caso concreto de quem exerce a greve", afirmou. Enfatizando que nenhum direito fundamental é absoluto, reportou-se à declaração francesa de 1789 para ressaltar a atualidade da afirmativa de que a liberdade de um termina onde começa a do outro. "Essa lição se mantém até hoje", concluiu.

Convenção 151

A Convenção 151 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) estabelece o princípio da negociação coletiva entre trabalhadores públicos e os governos das três esferas – municipal estadual ou federal. O documento foi ratificado pelo Congresso Nacional em maio de 2010, por meio do Decreto Legislativo nº 206. O senador Aloysio Nunes Ferreira informou que a sua integração ao ordenamento jurídico nacional ainda está condicionada à promulgação de decreto presidencial. O artigo 6º do Projeto de Lei 710/2011 estatui que a negociação coletiva deve obedecer aos preceitos da Convenção.

 

Fonte: TST

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