Ganha-pão de 240 mil catarinenses, a agricultura familiar oferece graves riscos à saúde e deveria ser uma atividade proibida a crianças e adolescentes devido aos riscos de intoxicação por agrotóxicos. O diagnóstico é do pesquisador da Unicamp Pedro Henrique Abreu, que apresentou a juízes do trabalho de Santa Catarina, na última sexta (19), um estudo no qual defende que o pequeno agricultor não tem como cumprir as regras de segurança no uso de pesticidas, cada vez mais presentes nas plantações de todo o Brasil, o maior consumidor mundial desse tipo de produto.
“São regras totalmente fora da realidade do pequeno produtor”, criticou o farmacêutico, cuja palestra encerrou o 4º Módulo de Estudos da Escola Judicial do TRT-SC, citando a exigência de um veículo com caçamba para o transporte dos pesticidas e a determinação para que os frascos sejam armazenados em depósito com piso cimentado.
Após pesquisar um conjunto de 60 procedimentos de segurança em 81 pequenas propriedades no município de Lavras (MG), Pedro Abreu concluiu que o uso de agrotóxicos deveria ser banido das pequenas propriedades por oferecer grande riscos de contaminação não apenas aos trabalhadores, mas também a seus familiares. “As roupas e os equipamentos de proteção geralmente são lavados no único tanque disponível da casa, contaminando todas as roupas da família”, apontou.
Regras demais
Segundo Abreu, o problema acontece porque as regras de segurança exigidas têm origem em procedimentos industriais, que não podem ser adaptados à estrutura das pequenas propriedades rurais e à cultura dos agricultores.
“Um produto que exige a leitura prévia de nove cartilhas de segurança definitivamente não é seguro para o consumidor”, argumenta o pesquisador, que considera injusto culpar os pequenos produtores por descumprir procedimentos complexos. “Mesmo que o agricultor quisesse cumprir todas essas regras, ele jamais conseguiria”.
Abreu citou como exemplo o uso do equipamento de proteção individual (EPI), que é obrigatório para a preparação e aplicação de agrotóxicos. O traje possui ao todo oito componentes, que devem ser colocados em uma ordem específica e retirados em outra sequência. Além disso, o EPI deve ser limpo em um tanque exclusivo, com escoamento para uma fossa séptica — procedimento ignorado pelos agricultores entrevistados na pesquisa.
“Não havia ninguém que soubesse como vestir a roupa”, lembrou o pesquisador, ressaltando que o traje não foi projetado para ser usado sob o sol. “A viseira fica embaçada, faz muito calor e dá uma sensação de falta de ar. Não é surpresa que ninguém consiga ficar meia hora usando esse tipo de roupa”, argumentou.
Legislação
Pedro Abreu fez duras críticas à legislação brasileira e aos órgãos governamentais que regulam a venda e o uso de agrotóxicos, afirmando que a aplicação desse tipo de substância só faz sentido no contexto do chamado agronegócio — monoculturas amplas e altamente industrializadas. Para ele, a Justiça do Trabalho deve encarar os pesticidas como um fator que precariza o trabalho do homem do campo e cujos riscos não podem ser controlados por equipamentos ou a partir de procedimentos simples. “Não há como falar em uso seguro de agrotóxico no âmbito da agricultura familiar”, concluiu.
Usados a partir dos Anos 50 para controlar pragas em plantações, os agrotóxicos têm origem em armas químicas usadas na 1ª e na 2ª Guerra Mundial e podem provocar malformação fetal, paralisias e câncer, entre outras doenças.
Os principais sintomas da intoxicação são dor de cabeça, dor de estômago e sonolência, que podem ocorrer em poucos dias ou até anos após a exposição ao produto. De acordo com a Organização Mundial de Saúde, a manipulação e o consumo indireto de pesticidas é responsável pela morte de 20 mil pessoas por ano em todo o mundo.
Texto: Fábio Borges / Foto: Adriano Ebenriter
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