3ª Turma anula citação feita só com duplo visto em número comercial no WhatsApp

Colegiado destacou que, com tantos golpes virtuais existentes, não é razoável exigir que um canal de atendimento identifique, com segurança, a veracidade de uma comunicação judicial

09/07/2025 13h31, atualizada em 10/07/2025 16h27
Mahfuzcht / Freepik

Citações judiciais, mesmo quando feitas por meios digitais, exigem a identificação clara de quem recebeu a mensagem e a comprovação de que essa pessoa tinha poderes legais para representar a parte – algo que não se pode presumir automaticamente quando a mensagem é enviada a um canal comercial.

O entendimento é da 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (TRT-SC), em um processo que já estava na fase de cobrança da dívida (fase de execução), mas teve todos os atos anulados porque não cumpriu requisitos considerados essenciais na fase inicial.
 

Caso


No processo movido na 3ª Vara do Trabalho de Criciúma, um separador de mercadorias buscava o reconhecimento de vínculo empregatício com uma empresa varejista. Como consequência, ele também pedia o pagamento de verbas rescisórias como saldo de salário, férias proporcionais, 13º salário e FGTS.

Na fase inicial, o oficial de justiça tentou notificar a empresa reclamada por meio do WhatsApp Business, versão do aplicativo usada para números comerciais. A mensagem encaminhada com o mandado foi lida (dois risquinhos azuis), mas não houve qualquer confirmação de recebimento, em texto, por funcionário ou outra pessoa com poderes de representar a ré.
 

Revelia
 

No dia da audiência marcada, a empresa não compareceu. Diante da omissão – e considerando suficiente a visualização da mensagem enviada – o juízo de primeiro grau reconheceu a revelia, que ocorre quando a parte não apresenta defesa no prazo legal, e condenou a empresa ao pagamento das verbas requeridas pelo trabalhador.
 

Citação anulada
 

Já na fase de execução da sentença, o sócio da empresa que passou a figurar como executado no processo apresentou recurso para o TRT-SC alegando nulidade da citação inicial. Segundo a defesa, não havia qualquer garantia de que o conteúdo da mensagem tivesse chegado a ele.

Na 3ª Turma do TRT-SC, o relator do caso, desembargador José Ernesto Manzi, acolheu o argumento da parte executada, anulando todos os atos processuais posteriores à citação. No acórdão, ele destacou  que o problema não foi a adoção do aplicativo em si, mas o fato de o mandado ter sido enviado a um número de atendimento comercial, sem qualquer retorno de texto, sem identificação de quem visualizou a mensagem e sem indícios de que o destinatário tivesse legitimidade para receber a citação.

“Se nem mesmo o cumprimento do mandado por intermédio de oficial de justiça –  figura investida de fé pública [...] – prescinde da adequada verificação da identidade da parte que está sendo citada e da certeza de que o conteúdo do ato foi efetivamente compreendido, com maior razão não se poderia admitir que o mandado exequido por meio de mensagens eletrônicas, notadamente pelo aplicativo WhatsApp, viesse a se esquivar de tais requisitos”, frisou.
 

Cenário de incerteza digital


A decisão também levou em conta o cenário atual de incerteza digital, marcado por golpes, perfis falsos e sistemas automatizados. Segundo o relator, diante desse contexto, não é razoável presumir que um canal comercial, muitas vezes acessado por diferentes pessoas, tenha condições de distinguir, com segurança, entre uma citação judicial legítima e uma possível tentativa de fraude.

Com a anulação, o processo retornou à 3ª Vara do Trabalho de Criciúma para nova tentativa de citação da empresa.

Não houve recurso da decisão.

Número do processo: 0000558-40.2023.5.12.0055
 

Texto: Carlos Nogueira
Secretaria de Comunicação Social do TRT-SC
Divisão de Redação, Criação e Assessoria de Imprensa
secom@trt12.jus.br

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