Promovido em parceria entre Ejud-12 e ESMPU, primeiro seminário sobre o tema encerrou nesta sexta-feira (22/8)
O seminário Mudanças climáticas e desastres socioambientais: repercussões no mundo do trabalho, promovido pela Escola Judicial do TRT da 12ª Região (Ejud-12) em parceria com a Escola Superior do Ministério Público da União, encerrou nesta sexta-feira (22/8) com um painel dedicado aos reflexos das emergências climáticas nas relações laborais e a conferência do ministro do TST Alberto Bastos Balazeiro.

A primeira atividade do dia reuniu a professora Cristiane Derani (UFSC), o desembargador Homero Batista Mateus da Silva (TRT-SP) e a procuradora Mônica Fenalti Delgado Pasetto (MPT-RS) em debate mediado pelo presidente do TRT-SC, desembargador Amarildo Carlos de Lima.
As exposições abordaram a importância dos tratados ambientais firmados entre países, as técnicas de preservação do contrato de trabalho em momentos de desastres climáticos e as consequências das enchentes de 2024 no Rio Grande do Sul.
Tratados ambientais e emergência climática
Cristiane Derani trouxe opiniões consultivas recentes – do Tribunal Internacional do Direito do Mar, da Corte Interamericana de Direitos Humanos e da Corte Internacional de Justiça – que, segundo ela, marcam uma mudança de paradigma ao detalharem obrigações dos Estados diante da emergência climática.
Esses entendimentos, de acordo com a professora, não criam jurisprudência, mas orientam interpretações. Entre os pontos centrais, está o dever dos Estados de agir e de responsabilizar os causadores de mudanças climáticas, inclusive empresas.
“O mundo recorre ao Judiciário para fazer valer o que durante 30 anos a política não fez”, afirmou. Ela alertou que não é necessário haver uma grande enchente ou seca para vivermos situações catastróficas: um simples aumento de temperatura pode inviabilizar a sobrevivência de milhares de pessoas.
No entanto, apesar da gravidade do tema, ao avaliar os posicionamentos das cortes internacionais, Derani concluiu em tom esperançoso. “Não podemos perder a fé. O futuro pode, na verdade, ser promissor.”
Preservação dos contratos

Na exposição seguinte, o desembargador Homero da Silva defendeu o uso de “técnicas de preservação do contrato de trabalho” como alternativa ao rompimento do vínculo nos momentos de crise, incluindo desastres ambientes. Segundo ele, é necessário superar a cultura de descarte e apostar em soluções que mantenham o vínculo contratual vivo até que a atividade econômica se restabeleça.
Entre os exemplos práticos, Silva citou a Medida Provisória 927/2020, editada no início da pandemia, como marco na aplicação de instrumentos emergenciais: “ela jogou uma corda quando o mundo parecia ter acabado”, frisou.
Férias coletivas, individuais, banco de horas, home office e até o aproveitamento excepcional de feriados foram resgatados como instrumentos eficazes, que podem ser usados inclusive diante de desastres climáticos. Para ele, isso se justifica porque a natureza contratual do trabalho é diferente das demais. “Nós temos um contrato assimétrico, entre seres humanos, bilateral, continuativo”, ressaltou.
Desastre no Rio Grande do Sul

Concluindo o painel, a procuradora do Trabalho Mônica Fenalti Delgado Pasetto fez uma retrospectiva do desastre climático que atingiu o Rio Grande do Sul em 2024.
De acordo com dados apresentados por ela, 478 dos 497 municípios gaúchos foram afetados e mais de dois milhões de pessoas sofreram impactos diretos, com 184 mortes confirmadas.
Os reflexos no emprego foram imediatos. “Em Eldorado do Sul e Roca Sales, cerca de 84% a 92% dos empregos formais foram eliminados”, relatou. Em Porto Alegre, pelo menos 27% dos estabelecimentos e 38% dos postos formais de trabalho foram diretamente atingidos.
Ela destacou que o episódio não foi imprevisível. "Entre 2013 e 2022, tempestades, enxurradas e inundações marcaram 5.199 municípios no Brasil. Isso dá 93% do total. Não há nenhuma novidade. O que aconteceu no Rio Grande do Sul era uma tragédia anunciada”, constatou.
Em busca de dignidade
No auge da crise, o MPT no estado criou o Grupo de Trabalho Desastre Climático, expedindo recomendações aos municípios e empregadores. Entre elas, a emissão gratuita de atestados de enchente para justificar ausências e a adoção de medidas alternativas como teletrabalho, banco de horas e acordos coletivos, buscando preservar contratos e renda. Na fase de retomada, orientou-se sobre riscos de contaminação por doenças como por exemplo a leptospirose, uso de EPIs e revisão dos programas de prevenção de riscos.
Mônica Pasetto enfatizou que a destruição de empregos, a precariedade das condições de trabalho e os efeitos sobre a saúde mental dos trabalhadores exigem respostas estruturais, inclusive legislativas. E concluiu: “o trabalho é o que nos dá dignidade”.
Processo estruturante
O evento foi finalizado com a conferência do ministro do TST Alberto Balazeiro, intitulada O papel dos processos estruturais na litigância climática relacionada ao trabalho. Segundo o ministro, para proteger os trabalhadores que mais sofrem com os impactos climáticos de uma forma definitiva, para além de decisões judiciais, são necessárias medidas estruturadas, que venham a ser colocadas em prática pela atuação de diversos agentes públicos e privados.
Um processo estrutural, na explicação de Balazeiro, é um tipo de processo que busca implantar uma reforma estrutural, a fim de concretizar um direito fundamental, realizar uma política pública, solucionar litígios complexos ou interesses socialmente relevantes. Geralmente é um processo de origem coletiva e que contém uma aspiração consensual, ou seja, reflete um anseio da sociedade.
“O processo estrutural surge a partir de situações sociais complexas, em que se observa profundo descompasso das práticas sociais com a ordem jurídica, em especial com os direitos fundamentais. Por consequência, almeja-se a correção do ilícito que conduz a esse descompasso”, explicou o ministro.

O magistrado exemplificou utilizando a metáfora da árvore com frutos venenosos, citada por Matheus Galdino em sua tese de mestrado, que mostra que, para solucionar questões complexas, não há soluções simples, como simplesmente mandar cortar os frutos - no próximo ano, eles aparecerão novamente. O ideal seria aprofundar a solução, cortando os galhos, ou mais ainda, o tronco da árvore, “eliminando o mal pela raiz”.
“Objetiva-se com o processo estrutural não apenas a reparação dos danos gerados pelos ilícitos por meio de ações indenizatórias, mas a mudança ou a indução a mudanças comportamentais coletivas ou individuais, relacionadas ao problema estrutural. Por meio de decisões estruturantes, que podem ter como norte as convenções internacionais, e planos de ação delineados em conjunto com outros órgãos públicos, é que será possível chegarmos a soluções concretas para questões complexas como essa do impacto climático", concluiu Balazeiro.
Assista na íntegra:
Texto: Carlos Nogueira e Camila Velloso
Secretaria de Comunicação Social
Divisão de Redação, Criação e Assessoria de Imprensa
secom@trt12.jus.br - (48) 3216.4000