“Melhor trabalhar do que roubar” e outros mitos: palestra discute enfrentamento ao trabalho infantil

Em evento da Ejud-12, desembargadora Lourdes Leiria apresentou protocolo de julgamento voltado à proteção de crianças e adolescentes. No mesmo dia, juízes debateram sobre saúde mental do trabalhador e trabalho do imigrante

26/06/2025 17h17, atualizada em 07/07/2025 14h33
Thiago Ibagy

“Melhor trabalhar do que roubar”. Essa é uma das muitas frases associadas ao trabalho infantil que a desembargadora Lourdes Leiria conclamou a serem desmistificadas em nossa sociedade, durante sua exposição realizada nesta quinta-feira (26/6), no 2º Módulo de Formação Continuada da Escola Judicial (Ejud-12). 

A palestra "Protocolo de Atuação e Julgamento com Perspectiva da Infância e da Adolescência", conduzida pela desembargadora e mediada pela juíza Janice Bastos, integrou a programação do evento, realizado no auditório da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SC) Subseção de Criciúma.

Confira o álbum de fotos do evento (link externo)

“Tem que trabalhar para ajudar a família”, “o trabalho dignifica”, “é bom porque aprendem desde cedo” - essas falas, frequentemente reproduzidas no cotidiano, são mitos e refletem a normalização do trabalho infantil na sociedade brasileira, destacou a magistrada.

Na ocasião, Leiria - que desde 2012 integra o Programa de Combate ao Trabalho Infantil e Estímulo à Aprendizagem da Justiça do Trabalho - desmistificou essas crenças e apresentou o Protocolo para Atuação e Julgamento com Perspectiva da Infância e da Adolescência, que reúne saberes, diretrizes e recomendações voltadas à atuação de magistrados e magistradas em julgamentos sobre o tema.

O documento, que tem como objetivo garantir a proteção integral e prioritária de crianças e adolescentes contra o trabalho infantil, foi elaborado por um grupo de trabalho formado por juízes da 5ª (BA) e da 21ª (RN) Regiões, com base em estudos e legislações nacionais e internacionais.

Como atuar sob a perspectiva da infância?


A desembargadora explicou que o protocolo oferece orientações para assegurar o melhor atendimento possível às vítimas. Segundo ela, desconstruir mitos e priorizar processos movidos por gestantes são exemplos de como atuar sob a perspectiva da infância.

“Ao dar prioridade aos processos de gestantes, estamos protegendo a primeira infância”, afirmou. Lourdes Leiria também destacou o papel fundamental de psicólogos e assistentes sociais, ao contribuírem com uma escuta ativa e evitarem a revitimização de crianças e adolescentes vítimas de violência.

 

Jovem aprendiz


Mais de 1,6 milhão de crianças e adolescentes de 5 a 17 anos estão trabalhando no Brasil, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), com dados de 2023. Destes, 586 mil estão nas piores formas de trabalho infantil — em áreas rurais, no trabalho doméstico ou nas ruas.

Os dados são alarmantes e apontam para o risco de descumprimento das metas da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU), que prevê a erradicação do trabalho infantil nos próximos cinco anos. Em Santa Catarina, cerca de 40 mil crianças e adolescentes ainda se encontram nessa condição.

Nesse contexto, a desembargadora destacou o Programa Jovem Aprendiz como uma alternativa segura. Ela foi responsável por implantar o Programa de Aprendizagem no TRT-SC ao final de sua gestão como presidente, em novembro de 2021. Atualmente, o tribunal conta com 42 aprendizes.

De acordo com Leiria, a condição de aprendiz é a única forma segura e legal de inserção de adolescentes no mundo do trabalho. Durante a palestra, ela compartilhou o plano de ampliar o Programa.

“Estamos nos empenhando para que possamos ter um aprendiz em cada unidade judiciária. Isso vai oferecer oportunidade de trabalho decente, principalmente no interior do estado”, concluiu.

 

 

Visita técnica à empresa Plasson teve palestra sobre saúde mental e roda de conversa com imigrantes

 

Cerca de 40 pessoas em uma sala de aula.
Juíza Maria Beatriz (de preto, de costas) conduziu roda de conversa sobre trabalhadores vindos de outros países 



Após a palestra, a programação do Módulo continuou com duas visitas realizadas pelos magistrados e magistradas presentes. A primeira delas foi ao Bairro da Juventude, organização social que atende crianças e adolescentes desenvolvendo projetos de educação integral, assistência social, saúde, inovação, criatividade e sustentabilidade. De acordo com o portal da instituição, sua missão é "promover, por meio da educação e assistência social, a garantia de direitos para crianças, adolescentes, jovens e suas famílias".

Homem calvo, vestindo roupa escura, fala em pé ao microfone
Juiz Rodrigo Goldschmidt falou sobre a NR1


No período da tarde, os juízes e juízas realizaram uma visita técnica à Plasson do Brasil Ltda., empresa de equipamentos avícolas fundada em Israel que possui fábricas próprias em outros sete países, sendo em Criciúma sua matriz brasileira. Desde 2016 ela é parceira do Programa Trabalho Seguro do TRT-SC. 

Durante a visita, foi realizada a palestra "Alterações da NR1: Riscos psicossociais e saúde mental dos trabalhadores", ministrada pelo juiz titular da VT de Araranguá, Rodrigo Goldshmidt, com mediação da juíza do trabalho Julieta Malfussi. Segundo Goldshmidt, para que as empresas tenham sucesso e mão de obra engajada é necessário que cultivem ambiente laboral decente, livre de práticas discriminatórias e abusivas. "Com isso, as causas do adoecimento físico e mental dos dos trabalhadores e trabalhadoras serão afastadas, construindo-se um cenário prometido pela Constituição, pautado pela dignidade e qualidade de vida”, afirmou o magistrado. 


Em seguida, os magistrados e magistradas assistiram à roda de conversa "Como é ser trabalhador migrante no Brasil?", conduzida pela juíza do trabalho Maria Beatriz Vieira da Silva Gubert com a participação de quatro trabalhadores migrantes da empresa, sendo 3 das regiões norte e nordeste do Brasil e uma trabalhadora imigrante do continente africano. De forma descontraída, a magistrada indagou sobre as origens e costumes desses trabalhadores e trabalhadoras, as dificuldades relacionadas ao trabalho no seu local de origem e no atual, bem como sobre o sentimento que têm em trabalhar em Santa Catarina. 

Após essa programação, os participantes visitaram a área fabril da empresa. Divididos em grupos, puderam observar a organização do modo de produção. "Serviu para observar as boas práticas realizadas pela empresa e, para o público externo presente, se inspirar com a possiblidade de adoção de algumas delas nos seus locais de trabalho, o que pode melhorar o meio ambiente laboral e torná-lo mais seguro e saudável", avaliou o juiz Ricardo Jahn, gestor regional do Programa Trabalho Seguro e auxiliar do Programa de Enfrentamento ao Trabalho Escravo, ao Tráfico de Pessoas e à Proteção ao Trabalho do Migrante (PETE+). 
 

Último dia


O 2º Módulo da Ejud-12 termina na manhã desta sexta-feira (27/6) com uma oficina sobre "Processo participativo de metas 2025", uma palestra com o tema "Redes sociais e relações de trabalho" e a participação de um radialista, que vai falar sobre "Fragmentos da história de Criciúma".
 


 
Texto: Nathaly Bittencourt (estagiária)
Supervisão: Priscila Tavares
Secretaria de Comunicação Social  
Divisão de Redação, Criação e Assessoria de Imprensa 
(48) 3216-4000 - secom@trt12.jus.br  

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