Colegiado considerou que, ao transferir trabalhador de 73 anos para outro estado sem o seu consentimento, União violou garantias previstas em lei
É ilegal transferir um empregado público “anistiado” – ou seja, readmitido após anos do fechamento do órgão em que trabalhava – para outra cidade sem o seu consentimento. A decisão unânime é da 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (TRT-SC), em ação envolvendo um trabalhador que teve o salário suspenso por mais de um ano após se recusar a deixar o interior de Santa Catarina para atuar em Brasília.
O trabalhador, morador de Capivari de Baixo, no Sul catarinense, foi contratado em 1984 pela Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), empresa pública ligada ao Ministério de Minas e Energia, que mantinha uma unidade no município na época.
Com a dissolução da estatal no início dos anos 1990, foi desligado e, posteriormente, anistiado pela Lei nº 8.878/94, que assegurou o retorno de empregados afastados por razões políticas ou administrativas consideradas injustas naquele período de reestruturação do Estado.
Reintegração
Reintegrado em 2012, passou a trabalhar no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) em Criciúma, município a cerca de uma hora de sua casa. Dez anos depois, em 2022, foi convocado pela União a se apresentar novamente no Ministério de Minas e Energia, mas desta vez em Brasília.
Aos 73 anos, o homem alegou não ter condições de se mudar por motivos de saúde e por ter família em Santa Catarina. Pela recusa, o seu salário foi suspenso a partir de janeiro de 2023.
Urgência
Diante da decisão da União, o trabalhador recorreu à Justiça do Trabalho em busca do restabelecimento da remuneração e da manutenção do vínculo em SC.
Na análise do pedido liminar, o juiz Ricardo Kock Nunes, da 1ª Vara do Trabalho (VT) de Tubarão, concedeu tutela de urgência para evitar o deslocamento. Ele determinou ainda que a União, em 30 dias, optasse entre manter o servidor em regime de teletrabalho ou reaproveitá-lo em outro órgão público federal da região de Capivari de Baixo, sob pena de multa.
Primeiro grau
Na sequência, o caso foi julgado pela juíza substituta Camila Torrão Britto de Moraes Carvalho, também da 1ª VT, que confirmou a liminar e considerou ilegal a transferência para Brasília.
Para a magistrada, a União não poderia impor a mudança sem o consentimento do trabalhador, especialmente porque a decisão exigia que ele deixasse o domicílio e a estrutura de vida construída no estado original. Ela lembrou que o artigo 469 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) proíbe esse tipo de transferência, e que a Lei nº 8.878/94 (de anistia) garante aos readmitidos o retorno nas mesmas condições do contrato original, inclusive quanto ao local de trabalho.
Competência confirmada
A União recorreu ao TRT-SC sustentando que o caso deveria ser analisado pela Justiça Federal, e não pela Justiça do Trabalho, por envolver um empregado público vinculado ao governo federal e uma decisão administrativa sobre sua lotação.
No entanto, a desembargadora Teresa Regina Cotosky, relatora do caso na 2ª Turma, afastou a tese da União e destacou que o vínculo do autor permanece celetista, já que sua contratação pela CSN (empresa pública) ocorreu sob a CLT. Assim, manteve a competência da Justiça do Trabalho para analisar a disputa.
Transferência ilegal
Ao manter a decisão de primeiro grau, a desembargadora ressaltou ainda que a transferência imposta sem consentimento viola princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da proteção ao idoso, previstos no artigo 1º, inciso III, e no Estatuto da Pessoa Idosa (Lei nº 10.741/2003).
A relatora acrescentou que a decisão do juízo de origem não interfere na autonomia da administração pública, mas apenas corrige a ilegalidade do ato que contrariou direitos trabalhistas e as garantias previstas na lei de anistia dos servidores públicos.
O colegiado também manteve o entendimento de que a suspensão do pagamento dos salários foi irregular. Portanto, a União foi condenada a quitar os valores retroativos correspondentes ao período em que o trabalhador ficou afastado, com todos os reflexos previstos em lei.
A reclamada pode recorrer da decisão.
Número do processo: 0001040-04.2024.5.12.0006
Texto: Carlos Nogueira
Reprodução: Secretaria de Comunicação Social do TRT-SC
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