Em SC, foram quase 6 mil casos em três anos. No Brasil, média de afastamentos chegou a 11% dos casos registrados
Categoria profissional mais exposta à covid-19, o profissional de saúde precisa enfrentar ainda outro problema em seu dia a dia: as atividades de atendimento hospitalar são as que mais afastam trabalhadores por acidentes e doenças do trabalho no Brasil. Algo triste, mas importante de se registrar no Dia Mundial em Memória às Vítimas de Acidentes de Trabalho, lembrado neste 28 de abril.
Em Santa Catarina não é diferente. De 2016 a 2018 (último dado disponibilizado pelo INSS), foram 5.787 casos no estado, representando 7,3% das ocorrências devidamente comunicadas ao INSS, ou seja, emitidas por Comunicação de Acidentes de Trabalho (CAT). No período, houve uma morte. O índice está abaixo da média nacional, de 11% e 63 mortes. Os dados foram extraídos da plataforma Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho, mantido pelo Ministério Público do Trabalho.
De acordo com o gestor do Programa Trabalho Seguro em Santa Catarina, desembargador Roberto Guglielmetto, a imprensa tem mostrado em seus noticiários a forma com que esses trabalhadores são expostos para executarem suas funções, sem as adequadas condições de higiene, segurança e saúde. “A precariedade e insuficiência de equipamentos de proteção individual e coletiva nesse setor não é fruto exclusivo deste momento de doença altamente contagiante”, afirma o desembargador, em artigo publicado nesta terça.
Para ele, os dados de acidentes e de doenças do trabalho no setor da saúde são alarmantes e já vêm de longa data, não se resumindo a médicos e enfermeiros, mas a todos que executam atividades na área de ambiente hospitalar, dado o risco elevado de contaminação por agentes químicos e biológicos e por radiação ionizante. A ocupação de faxineiro, por exemplo, é a terceira que mais se afasta, com 9% dos casos, ficando atrás dos técnicos de enfermagem (52%) e dos enfermeiros (10%).
“A NR (norma regulamentadora) 32 auxilia na identificação de riscos e é importante que seja rigorosamente cumprida, a fim de dar a segurança necessária para que os profissionais de saúde possam executar dignamente suas atividades”, finaliza Guglielmetto.
O que dizem os representantes do MPT-SC, dos trabalhadores e dos empregadores
Bruno Martins Mano Teixeira
Procurador do trabalho e gestor, em SC, da Coordenadoria Nacional de Defesa do Meio Ambiente do Trabalho (Codemat)
É de fato preocupante o elevado número de casos de acidente de trabalho envolvendo trabalhadores da saúde, sobretudo se considerarmos o provável aumento no atual cenário de pandemia. Ainda que a atividade em si exponha os profissionais a riscos mais elevados do que outras atividades, certamente há medidas a serem adotadas para que a quantidade de afastamentos seja reduzida.
Do total de 5.787 afastamentos com CAT entre 2016 e 2018, cerca de 43% decorreu de acidentes punctórios, corte por instrumentos de trabalho (como bisturis) ou contaminação de mucosas (boca, nariz e olhos) por resíduos biológicos. Ainda que não haja dados sobre o percentual de acidentes decorrentes pela não utilização ou uso incorreto dos equipamentos de proteção individual, o combate à covid-19 tem evidenciado a falta de treinamento dos profissionais no tocante ao uso correto de equipamentos de proteção individual.
Afora isso, é sabido que a jornada de trabalho dos profissionais de saúde é elevada, principalmente em unidades hospitalares, em que comumente são cumpridas escalas de 12x36 - a qual, aliás, acaba geralmente resultando em jornadas de 12 horas em outro estabelecimento durante as 36 horas de descanso.
Em que pese tal espécie de carga horária seja considerada válida pela jurisprudência, é inegável que gera aumento dos riscos de acidentes aos profissionais de saúde. Além disso, a extensa carga horária somada ao volume excessivo de trabalho ocasiona diversos afastamentos por problemas de ordem psicológica (uma média de quase 400 casos por ano).
Assim, ainda que, como dito, os riscos a que se expõe os profissionais de saúde sejam mais elevados do que o ordinário, medidas como o investimento em treinamento e redução de jornada podem ser adotadas para que o alto número de afastamentos no atendimento hospitalar seja reduzido.
Wallace Fernando Cordeiro
Diretor de assuntos jurídicos do Sindicato dos Trabalhadores em Estabelecimento de Saúde Pública Estadual e Privado de Florianópolis e Região (Sindsaúde)
A covid-19 trouxe à luz a falta de condições de trabalho enfrentada diariamente pelos profissionais de saúde. Embora o setor de diagnóstico tenha passado por uma revolução tecnológica, com máquinas ultramodernas, os equipamentos e utensílios que os profissionais utilizam no dia a dia são os mesmos há 20 anos em alguns hospitais, inclusive privados.
Um estudo que encomendamos sobre as condições de trabalho nos hospitais revelou muitos problemas osteomusculares, consequência da falta de ergonomia no ambiente de trabalho. Para se ter uma ideia, cheguei a reconhecer as mesmas macas durante uma visita recente a um hospital no qual trabalhei, de 2000 a 2006.
Os hospitais e clínicas não investem como deveriam em equipamentos como protetores de dedo, por exemplo, utilizados no manuseio das seringas, o que explica o elevado número de acidentes como cortes e perfurações.
A sobrevida da carreira de um profissional da saúde é muito curta depois dos primeiros 10 anos de trabalho. A partir daí os afastamentos passam a ser frequentes, tanto pela falta de condições de trabalho como pelo desgaste psicológico. Esse, aliás, é um outro problema: os hospitais não dispõem de atendimento psicológico para seus trabalhadores.
Braz Vieira
Diretor-executivo da Federação dos Hospitais e Estabelecimentos de Serviços de Saúde no Estado de Santa Catarina
Ficamos surpreso por estar no topo do ranking. Sempre discutimos com a Federação dos Trabalhadores, nas negociações coletivas, as normas regulamentadoras que tratam da saúde e segurança dos profissionais e a questão do desgaste emocional, mas nunca os números em si.
Contamos com cerca de 30 mil profissionais na rede privada de saúde, talvez isso pese na conta, mas não posso fazer essa afirmação, precisaríamos de um estudo aprofundado sobre esses números.
Outra situação que pode explicar o elevado índice é que praticamente não ocorre subnotificação de acidentes na área de saúde, pois sonegar uma CAT poderia gerar contaminação e propagação de doenças para os trabalhadores e para os pacientes, algo muito sério.
Quanto aos equipamentos, todos os que são adquiridos pelos estabelecimentos de saúde privados seguem as normas e especificações da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Principais estatísticas do setor (2016 a 2018)
Fonte: Observatório de Saúde e Segurança do Trabalhador, plataforma que cruza os diversos dados compilados pelo INSS
Lesões mais frequentes
1º Cortes, lacerações, feridas contusas (por compressão) e puncturas (perfurações): 26% dos casos (1.480 registros)
2º Lesão imediata (que se manifesta no momento do acidente): 16% (899)
3º Contusão, esmagamento (superfície cutânea): 14% (789)
Partes do corpo mais atingidas:
1º Dedos: 38% (1.261)
2º Mão (exceto punhos e dedos): 8% (472)
3º Olho (inclusive nervo ótico e visão): 7% (399
Grupos de Agentes Causadores
1º Biológico: 22% (1.280)
2º Químico: 22% (1.260)
3º Ferramentas manuais: 17% (949)
Agente Causador
1º Agente infeccioso ou parasitário: 14% (803)
2º Produto biológico (soro, toxina, antitoxina): 12% (690)
3º Ferramenta manual sem força motriz: 9% (538)
Ocupação mais suscetível
1º Técnico de enfermagem: 52% (2.965)
2º Enfermeiro: 10% (586)
3º Faxineiro: 9% (506)
Texto: Clayton Wosgrau / Foto: Banco de imagens
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